Thursday, September 26, 2024

PARAZINHO: LIVRO - 1925

Livro: A Novena de Nossa Senhora do Livramento 

Por Mons. Vicente Martins 

Ano: 1925


     O histórico livro da novena de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho, do ano de 1925, é o primeiro livro que conseguimos encontrar, relatando a história de Parazinho por meio do relato de inúmeras graças alcançadas por intercessão de Nossa senhora do Livramento em sua milagrosa Igreja de Parazinho. 

    Este livro, que é um dos principais tesou-ros de nossa história, foi escrito a exatamente cem anos, por Mons. Vicente Martins da Costa de venerável memória, então, em comemoração ao centenário de tão significativa memória de nossa terra, publicamos aqui, para a perpetuação desta obra, o conteúdo integral do livro. 

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Obs: não modificamos a grafia original, o que faremos em uma publicação futura e no contexto do centenário deste histórico documento, faremos uma publicação do texto atualizado com a grafia moderna e outra publicação com explicações e comentários sobre essa salutar obra que primeiro registrou nossa história.


Tuesday, September 24, 2024

Parazinho - 1974

 Texto do Livro "Granja - Assentamentos históricos do município e a festa religiosa de N.s. do Livramento do Parazinho" de Guilherme Teles Gouveia, 1974.


Este texto traz um excelente relato histórico sobre a origem de Parazinho e os avanços naquela década de 1970, a exatos 50 anos. Além disso traz fotos históricas e a novena de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho. 

Obs: Este livro está exposto no Museu Monsenhor Vicente Martins da Costa. 


















A Festa de Parazinho em 1909

 Publicado no Jornal "Nossa Senhora do Livramento" de 1909.

Xilogravura publicada na capa do jornal em 1909.


EM PARAZINHO

Ao P.e V. Martins

Naquela manhã, clara e risonha manhã de julho, sob os quentes raios dum sol, gloriosamente de estio, chegara eu ao Parazinho, onde, ao convite dum velho amigo, o Luiz, ia assistir os últimos dias da festividade da Virgem do Livramento, gloriosa padroeira da encantadora povoação.

Apeando-me à porta da casa do meu hospedador, fui recebido por uma série intempestiva de “bravos e vivas”, partidos dum punhado de antigos condiscípulos e velhos camaradas meus, em cujo número se destacava a figura simpática e rotunda do Luiz, mais alegre, mais hospitaleiro, e, se me permitem o comparativo, mais amigo ainda.

Eu, a princípio, acanhado, fui procurando tornar-me comunicativo, me acamaradando com os homens, sorrindo-me às senhoras, para contrabalançar-lhes no espírito alguma má impressão, causada pelo meu exterior, um tanto exótico, mas tão sem razão foi minha ideia, que, ao quere-la por em prática, fui logo cumulado de atenções e fidalguias, aliás imerecidas, pelos conterrâneos de Lívio Barreto.

À tarde desse mesmo dia, já me achava eu tão familiarizado com essa sociedade de escol, que dir-se-ia conhecido de muitos anos, em convívio quotidiano, e a tal ponto que tornei-me em breve, tão granjense, como os melhores granjenses; tão parazinhense como os mais ardorosos e genuínos filhos do Parazinho.

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*

Uma das notas predominantes dessa festa do Parazinho, foi, sem dúvida, o Arthur, o delicioso e incomparável Arthur, em cujo cérebro armazenava, com pasmosa e invejável fertilidade, um sem número de modinhas, cançonetas e chulas, para todos os assuntos, para todas as reuniões.

Numa das vezes, ouvindo eu dum número de senhoritas, agrupadas em roda, os doces e maviosos acordes duma voz de anjo, que cantava, para lá me encaminhei, e no centro desse círculo adorável, avistei o Arthur, que com uma grossa e tosca bengala, à guisa de batuta, marcava, à gentil cantora, um compasso impossível, ereto e teso como um boneco.

A reunião prometia ir muito além, se não fossemos interrompidos por uma senhora já idosa e de semblante alegre e bondoso, e à porta de cuja casa tinha lugar aquela agradável serata, a qual delicadamente nos pediu, fizéssemos ponto final, uma vez que já era tarde, e tinha necessidade de repousar.

Entre protestos surdos, íamos dissolver tão encantadora reunião, quando vimos o incorrigível Arthur, que entre reverentes e exageradas zumbaias e com palavras alambicadas, conseguia enfim da boa senhora, uma curta prorrogação.

Mais tarde, refestelado numa macia rede bordada, me achava eu a conversar com o Luiz, sobre assuntos comerciais, quando ouvimos, à nossa porta, a voz esganiçada do Arthur, que, num tom dolente, choramingava:

“Aqui estou em vossa porta

Em figura de raposa.”

Tivemos de abri-la, para dar entrada ao Arthur, Horácio e ao Raul que acompanhavam duas mimosas senhoritas.

Num ápice, improvisou-se, ali mesmo, uma sessão litero-cantante, na qual, após alguns recitativos, pelos representantes do sexo forte, uma das senhoritas, depois de recitar, com gracioso desembaraço o

“Vamos lá, toque a Dalila

Que também vou recitar”, de Gregório Júnior, cantou, numa voz, que certamente os anjos invejariam se ouvissem-na, uma saudosa modinha, enquanto o Horácio, todo casquilho e gamenho, com o queixo caído sobre o violão, arrancava desse instrumento sertanejo, notas harmoniosas que perfeitamente se casavam com a voz, argentina e mimosa da exímia cantora.

*

* *

Chegara enfim o dia da festa.

Imponentíssima, a missa solene que decorreu em meio de enorme assistência e ao espocar de foguetes e salvas, enquanto, no alto, o sino entoava gorjeios festivos, como se uma multidão de canários viesse ali pousar.

Durante o dia, o mesmo formigar constante, o mesmo vai e vem continuo, agora mais numeroso e que lhe emprestava também um tom mais de festa, em vista das duas bandas de música que frequentemente transitavam pela praça engalanada.

À tarde desfilou a procissão acompanhada por um número incalculável de devotos.

Pelas janelas, calçadas e até pelo meio da praça viam-se piedosas mulheres, de lençol a cabeça; homens rústicos, com enormes chapéus de couro e de palha grosseira debaixo do braço, ajoelhados, contritos, à passagem do andor da Virgem do Livramento, que, com aquele doce e maternal sorriso que tão bem (mutilado), abençoava aqueles romeiros súplices, numa explosão de amor e carinho.

Depois, a debandada geral. Vários cavaleiros, envoltos em densa nuvem de pó, passavam céleres, numa vertigem de fuga precipitada, enquanto senhoritas gentis, com a elegância e donaire de consumadas amazonas, montavam fogosos animais, que, orgulhosos de tão linda carga, erguiam altivamente a cabeça, sacudindo as crinas ao vento.

E fugiam sempre, como visões místicas, em meio dum coro de saudosos adeuses e votos de boa viagem, enquanto pelo ar, derramavam-se, em complicado e gracioso labirinto; milhares de lenços brancos como o lírio, e agitados docemente pela mansa brisa que perpassava então, esses interpretes, fiéis e eloquentes, da Despedida, talvez aninhassem furtivamente, alguma lágrima retardada que indolentemente viesse ali boiar.

Camocim, – 6 – 909.

PEDRO MOREL


Parazinho-Ceará em 1909

 Texto do Mons. Vicente Martins da Costa publicado no jornal "Nossa Senhora do Livramento" de 1909

Igreja Primitiva (Educandário)
Em 1908

Mons. Vicente Martins



PARAZINHO

Cerca de vinte e cinco quilômetros distante da cidade de Granja, paira a poética povoação do Parazinho, com as suas moradias brancas que se apinham em forma de quadro em volta da pequena ermida em cujo altar descortina-se a bela imagem de N. S. do Livramento a quem se atribuem prodígios miraculosos.

Parazinho é deste cantinho do norte a povoação incontestavelmente mais simpática, mais atraente, mais conhecida e mais alegre pela sua posição pitoresca, pelo seu clima salubérrimo, pelo seu aspecto risonho. Por suas casinhas bem alvas, por sua igreja pequenina de torrezinha branca perdendo-se no espaço, pelo seu regato de aguas cristalinas e murmurosas, pelos seus habitantes ordeiros e amáveis, e principalmente, notavelmente por sua festa tradicional a gloriosa Virgem do Livramento, que por dez dias toca ao delírio, fazendo divertir à perder a cabeça até o mais rígido velho de tempera antiga.

Jogos, diversões, reuniões, saraus, brinquedos de toda sorte, prendas, anéis, passatempos, divertimentos simples, íntimos e ingênuos, tudo que um espírito irrequieto, diversivo, sôfrego de entretenimento pode criar e inventar, tudo aí aparece para endoidecer a mocidade e lembrar aos velhos nessa idade de ostracismo e marasmo as doces recordações do passado.

Dez dias de festa! São dez dias de desatinos juvenis e alegrias delirantes.

Aí não há desigualdade de família nem proeminência de classe, nem rixas nem desafetos, nem lutas nem intrigas; por toda parte, em todo instante, quer às horas de um sol intente, quer aos começos tristíssimos da noite, senhoritas, crianças e cavalheiros, passam rindo, folgando gargalhadamente, aos grupos, num vai e vem constante, enchendo os espaços de vozes e risos, com grande encanto, em indizível harmonia, a derramar aqui as alegrias e emoções dulcíssimas de uma pas (mutilado) de flores.

No templo, aí nesse recinto que a piedade consagrou àquela que chamamos Maria, aí é que esse delírio que a todos inebria, toca o entusiasmo, chega ao religioso e torna-se divino. Aí é que respira-se a religião e sente-se a fé em suas belezas e transportes, em suas grandezas e sublimidades. Aí é que a alma repleta de amor e plena de veneração ajoelha-se ante a imagem dessa Virgem amabilíssima, e no extase da contemplação, na embriaguez dos mistérios altíssimos sente-se feliz, felicíssima e entoa cânticos piedosos, melodiosos, a excelsa Rainha, dispensadora dos tesouros eternos e celestiais.

Aí, finalmente, é que todos, grandes e pequeninos, jovens e anciões, de desigualdade de sortes e diversidade de condições vindos de diferentes lugares, unidos pelos mesmos elos de convicção e de crença, a despeito da impiedade que reina materializando tudo, negando tudo e pervertendo tudo, dão o mais vivo testemunho da fraternidade cristã que ensina o Evangelho do Calvário e clamam pelos seus votos, pelas suas ofertas e pelos seus sacrifícios, que Maria é a mulher por excelência, a virgem privilegiada, a senhora amabilíssima, santíssima, poderosíssima.

Para o último dia cerca de quatro mil almas se aglomeram no largo que compreende o belo povoado, que se transforma então em uma cidade em festa, em um pequeno mundo onde triunfam a religião e a crença.

De tudo que fica dessa festinha incomparavelmente simpática, resta lamentar somente, não haver aí uma escola para difundir a luz da civilização.

Mas não vem longe o dia em que o Parazinho contará com esse melhoramento para marchar a vanguarda dos povos cultos, civilizados.

O benemérito Dr. Nogueira Accioly que não regateia sacrifícios em prol da instrução, não retardará sancionar esse decreto tão benfeitor quanto desejado.

Padre V. Martins


A FESTA DO PARAZINHO

Crônica

A FESTA DO PARAZINHO       

Por: Raimundo Pompe 

               Há quem considere o passado um elástico temporal, na medida em que está sempre a se repetir na memória das pessoas, sobretudo daqueles que viveram na intensidade da sua plenitude. E para fazermos uma viagem no tempo, escolhemos um dos nossos acontecimentos mais marcante: “A Festa de Nossa Senhora do Livramento do Parazinho”.

              Vejo pelos olhos da memória e recordações sentidas o tempo onde todos ansiosamente aguardavam o início dos festejos. A felicidade se manifestava na alma e no coração do povo, onde todo ele palpitava numa sugestão de alegria. A festa era de todos. Desde a criança que sonhava em aproveitar os dez dias de intensa animação, aos mais velhos, alguns já curvados pelos anos, com os olhos marejados de saudade ao recordar seu tempo de mocidade.

                 A cada ano a Festa ostentava mais fulgor. Entre os dias 22 de junho a 2 de julho o tristonho e sonolento Parazinho transformava-se num lugar vibrátil e trepidante. Uma massa incomputável enchia o lugarejo. Vinha invariavelmente gente dos mais diferentes lugares. Até de outros Estados. Os que vinham de longe chegavam em lotações do tipo “Jardinheiras”, meio de transporte bastante comum naquela época, e ficavam alojados em redes, nas próprias carroçarias dos caminhões.

              A viagem não era muito prazerosa. Não havia  terraplenagem, e portanto, sobravam buracos na antiga estrada. Os únicos meio de transporte eram jipes e caminhões paus-de-arara, que apinhados de gente, atravessavam o nosso rio Coreaú,  invadindo aquela carroçável estreita e sinuosa, deixando para trás o rastro fulgaz de poeira naquela paisagem buliçosa.

                Meu pai era “chauffeur” de praça, diariamente ia e vinha em seu velho jipe, ano 54, de fabricação americana, levando e trazendo famílias inteiras que iam participar das solenidades religiosas. Eu adorava acompanhá-lo nas suas viagens. Para mim era uma aventura "Off-Road". 

             Lembro-me que durante as quatro léguas de percurso, era comum se encontrar várias pessoas a cavalo e outras a pé, com direito a descanso naquela antiga casa alpendrada dos Gracianos, no “Mato Grosso”. Não era para menos. O imenso areal da estrada exauria as canelas dos devotos, que só sentiam alivio quando avistava as “cruzinhas”, sinal que a caminhada estava quase no seu fim. 

               Mesmo assim, nem a exaustiva caminhada, nem os sacolejos e balanços das carroçarias dos caminhões eram suficiente para roubar o ânimo dos fiéis que com suas roupas e os cabelos embatumados de poeira, invadiam as ruas da antiga povoação, alegres e trêfegos, como um “pierrot” em baile carnavalesco.

              A entrada era pelo mesmo lugar. De longe dava para se ouvir os foguetes pipocando no ar e o timbre sonoro e forte do sino da igreja chamando os fiéis para a oração. Em pouco tempo a igreja estava “tinindo” de gente para participar das missas e novenas, soleníssimas. A todos instantes ouvia-se os vivas exaltados num atestado eloquente da mais acentuada fé a Nossa Senhora do Livramento. 

        Relembro com saudade aquela magnífica banda de música executando lindos dobrados nas alvoradas nas manhãs frias do mês de  junho, numa harmonia inebriante na sua riqueza de ritmos e de sons, cujas músicas ainda me soam os ouvidos. Quanta coisa bonita pontilhada de ternura!

              Como eu era criança, dada a minha pouca idade na época, pouco me lembro do tempo em que o vigário era monsenhor Vitorino de Oliveira, no entanto ainda lembro-me da sua figura no patamar da igreja recebendo seu rebanho de fiéis com satisfação e jeito. Consoantes os que me afirma, ele era um homem respeitado por todos e, portanto, seu nome sempre será lembrado. Deixou este mundo, faz anos.

                  Após as solenidades religiosas, rapazes e moças rodeavam a igreja maior, enquanto que ao redor da igrejinha antiga, vestuta, outros casais travavam namoro às escondidas. Naquele tempo havia austeridade, respeito. Hoje é que nos namoros acontecem esses agarrados nú, às claras.

                  Enquanto isso, por outro lado, milhares de pessoas subiam e desciam aquelas ruas pedregosas do velho Parazinho. Era gente pra lá e pra cá, de barraca em barraca. Havia de quase tudo para se comprar. Desde coisinhas miúdas, bugigangas, quinquilharias, às luxuosas barracas dos joalheiros, onde sob  a luz dos “Petromax” brilhavam as jóias e miçangas caprichosamente expostas em mostruários forrados na mais fina vaqueta vermelha, semelhando-as a um rico tesouro. Ali havia todo tipo de novidades: medalhas, trancelins, correntes, brincos, alianças de noivado e anéis de luxo encimados por enormes pedras coloridas.

          Da Serra Grande vinha os comboieiros, sempre trazendo nos lombo dos jumentos, vários grajais com  muitas frutas e verduras, além de uma ruma de batidas, tijolos, bolos“manuês”, e também alguidar, panelas, potes e jarras de todo tamanho, tudo feito do mais puro barro.

                Não faltava também aqueles fotógrafos ambulantes e suas máquinas lambe-lambe, montadas sobre um tripé de madeira, onde a matutada se comprimia para tirar um foto exibindo seu “pincenês” de lentes escuras, junto aqueles painéis pintados com a imagem do taumaturgo São Francisco do Canindé. Fotos coloridas naquele tempo só aquelas nos pequenos "monóculos', que ficavam expostos  pendurados  num cordão.  Meninos como eu eram doidos para se fotografar montado naqueles cavalinhos de madeira.

               Para os que liam, havia os vendedores dos livretos de literatura de cordel. E para animar os que pouco liam os violeiros fazendo  rimas no mais autêntico improviso desfilando seus repentes ao gosto do freguês. Até os “botadores” d’água paravam seus jumentos com ancoretas e tudo, e ficavam de queixo caído em admiração aos repentistas, e de vez em quando os níqueis iam caindo, uma a um, nas “coités” dos poetas. Mais adiante  ouvia-se vozes diferenciadas. Eram os vendedores de ervas, raízes medicinais e daqueles célebres óleos e pomadas “milagrosas” que acabava de identificar na sua platéia mais um portador de uma  enfermidade capaz de ser curada pelo produto em questão. Tinha remédio para todo tipo de “murrinha”.

               Naquele tempo não havia festinhas, sambas e maxixes. O vigário impedia tudo isso e o povo, passivamente, aceitava, com medo de ser enquadrado na categoria de subversivo. Que eu me lembre, os arrasta-pés só passaram a acontecer já de uns anos para cá, no meu tempo de rapazola,  mais isso só acontecia  do outro lado da parede do açude, no “Rabo da Gata”.

              Certa vez, em uma  das minha noite de vadiagem, eu, em companhia de amigos, resolvi furdunçar naquele palco onde funcionava o bagaço que glorificava a “cana”. Acabei me influindo para aprender a dançar, para depois, entrar nos bailes da chamada sociedade, e aí fui parar no “Salão” do seu Paixão. Não havia energia elétrica. A iluminação do ambiente eram lampeões com querosene, feitos de garrafas de vidro com o pavio de estopa. Foi ali que arrisquei os primeiros passos de dança, mas logo no início desisti dos ensaios. Tudo não passou de um malogro, de um fiasco, para não dizer de um desastre a minha estréia na arte coreográfica, e logo nos começo acabei pisando nos pés do meu primeiro par, uma cabrocha da “Tiáia”, que reclamou aperreada, com os dedos todos pisados, e eu capitulei, abandonando a ideia de ser dançarino. Foi nesta mesma noite assisti, pela primeira vez na vida, um ensaio de briga de faca. Apavorado, dei uma baita carreira, ganhando o bredo, descendo, aperreado, aquelas ruas rampeadas. 

              Mas a diversões preferidas  era mesmo nos “botes”, aquele tipo de barquinho que todo ano ficavam instalados no largo na entrada da rua principal. Gente ali era como confete. Todo ele pronto para se balançar naquelas barquetas de madeira.  

             Mas no velho Parazinho, animação se via na noite de São Pedro. Eram tantas fogueiras que parecia o incêndio que dizimou a Roma de Tigelinus, a mando do imperador Nero. As calçadas ficavam lotadas de gente. Em cada  casa ardia a chama da tradição. Por gosto se via famílias inteiras reunidas, a deleitar-se em animadas rodas de conversa, numa ciranda festiva. Era noite de alegria e fartura, de pedaços de carne assada na brasa. 

             Fartura e comida gostosa, no Parazinho, a gente também encontrava na cozinha cheirosa da Pensão da dona Moça Cafajé, que era um primor de higiene. Sua densa e suculenta culinária seduzia a gente: galinha à cabidela, linguiça caseira, sarapatel, panelada e carne de de criação "muçiça”, cozido de boi e aquele delicioso pirão escaldado, fumaçando como chaminé. Era de encher a boca d’água. Merecia ser saboreada de joelhos.

              Tudo isso ficou pra trás, perdido nas páginas amareladas pelo tempo. São fatos e personagens que marcaram uma geração, e que a geração atual  não terá como conhecer, sem os esforços das recordações  daqueles que presenciaram tudo isso, e hoje, de alguma forma, desejam perpetuá-los  na memória histórica da Festa do Parazinho.

              Porém, esses escritos não se trata de saudosismo, apenas. É uma maneira  de tentar resgatar as coisas boas da Festa do Parazinho, nos tempos de outrora, pois é como diz uma canção de sucesso: “nada do que foi será do jeito que já foi uma dia...”


 Raimundo Pompe

Monday, September 23, 2024

João Victor Mascarenha

 Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



- Biografia do Autor:


João Victor de Oliveira Mascarenha, nasceu em Camocim-CE aos 04 de março de 2002, residindo em Parazinho desde o tempo em que nasceu.

Pesquisador da história e cultura de sua região, homem do povo, gente da gente, poeta, escritor e celebrante de ofícios religiosos; Não se orgulha nem se vangloria de seus dons e saberes, ao contrário, com muita humildade coloca-se a disposição de todos, principalmente dos que não tiveram acesso ao conhecimento. 

Fundou em Parazinho o Museu Monsenhor Vicente Martins da Costa, onde apresenta aos visitantes a história e cultura de Parazinho, atualmente luta pela estruturação do Museu e sua oficialização por parte das autoridades competentes.

Elementos Textuais do Livro

Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 

 Fontes Históricas:


A Capela Milagrosa de Nossa Senhora do Livramento do Parasinho-1924 - Costa, Vicente Martins. 


Cronologia Sobralense - Tomo I - Araújo, Francisco Sadoc.


Noticia Historico-Chorographica Da Comarca de Granja pelo Padre Vicente Martins - Revista Trimestral do Instituto do Ceará ano de 1915.


Granja - Assentamentos Históricos do Município e a Festividade Religiosa de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho - 1974 - Gouveia, Guilherme Teles.


Arquivo Nacional da Torre do Tombo – Portugal – Chancelaria de D. João V, livro de Doações, Ofícios e Mercês, nº 51 fls. 769.


Revista Trimestral do Instituto do Ceará - Datas e Factos para a História do Ceará - 1895 - Studart, Guilherme Chambly.


Revista Trimestral do Instituto do Ceará - Notas para a História Eclesiástica do Ceará, 1946 - Mota, Leonardo.


“Na distância e largueza do sertão”: Administração e sediação nos sertões do Siará Grande (1682 - 1735) - 2020 - Couto, Gustavo Melo - Dissertação de Mestrado, UFRN.

A Capitania do Siará Grande nas dinâmicas do Império português: política sesmarias, guerra justa e formação de uma elite conquistadora (1679-1720) - 2016 - Silva, Rafael Ricarte da - Tese de Doutorado, UFC.


“Minha Riqueza é Fruto do meu Trabalho”: negros de cabedais no Sertão do Acaracú (1709-1822) - 2015 - Souza, Raimundo Nonato Rodrigues de - Tese de Doutorado, UFC.


https://commons.m.wikimedia.org/wiki/File:ND_D%C3%A9livrande_Morne-Rouge_9.jpg#mw-jump-to-license


https://fr.m.wikipedia.org/wiki/Basilique_Notre-Dame-de-la-D%C3%A9livrande_de_Douvres-la-D%C3%A9livrande


https://arquisp.org.br/liturgia/santo-do-dia/nossa-senhora-da-livracao


https://fr.m.wikipedia.org/wiki/Basilique_Notre-Dame_de_Montligeon


https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Igreja_da_Mem%C3%B3ria


http://www.silb.cchla.ufrn.br/sesmaria/CE%200421


http://www.silb.cchla.ufrn.br/sesmaria/CE%200847


Fotografias - Acervo pessoal.


Datas Importantes para a História de Parazinho

 15° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 


03 de agosto de 1702 - Domingos Machado Freire e Miguel Machado Freire recebem doação de terras em sesmarias, Domingos se instala e funda o povoado do Pará.

1712 - Chega à região o Padre João de Matos Monteiro, ainda coadjutor e depois primeiro cura da Ribeira do Acaracu, em cujo vicariato foi construída a Igreja Primaz de Parazinho.

1719 - Possivelmente neste ano foi inaugurada a Igreja Primaz. 

1722 - Criado oficialmente o Curato do Acaracú, sendo nomeado primeiro cura o Padre João de Mattos Monteiro. 

1754 - Em 15 de Março falece o português Capitão Domingos Machado Freire, patriarca do Parazinho.

1795 - Adquirida a Imagem de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho que se venera no altar mor do Santuário.

1888 - Construído o primeiro cemitério público

1892 - Construída a primeira barragem do riacho(açude) sob comando do Padre Francisco Ignácio da Costa

Mendes.

1911 - Realizado 1° estudo para a construção do açude

por interferência do vigário Monsenhor Vicente Martins

da Costa, sendo responsáveis o agrimensor italiano

Vicente piceffinini em abril e em novembro o agrimensor

americano Dr. Geraldo Waring.

1911 - Em 05 de Novembro acontece a primeira Peregrinação Vicentina. 

1916 - Tem início no mês de agosto as obras do açude,

sendo responsáveis o engenheiro Dr. Floro Freire.

1917 - São concluídas as obras do açude sob comando

dos engenheiros Dr. Pinto Pompeu e Dr. José Pereira. A

obra foi realizada com recursos do governo federal e

após a inauguração foi entregue a administração do

governo estadual.

1921 - Em julho é iniciada as obras da estrada Granja à

Parazinho, sendo responsável o Dr. Plínio de Castro

Nunes. Foi inaugurada em 06 de novembro do mesmo

ano, dia da peregrinação, com o primeiro carro que

adentrou no Parazinho.

1932 - Dom José Tupinambá da Frota proíbe qualquer

tipo de festa dançante durante a festa do Parazinho.

1940 - Foi instalada na igreja e arredores luz elétrica a

motor.

1941 - Lançamento da pedra fundamental do atual

Santuário no dia 02 de julho. Em setembro as obras

foram suspensas.

1942 - Em 18 de agosto as obras foram retomadas

1944 - Em 06 de janeiro começaram as celebrações da

inauguração, a nova igreja foi abençoada por Dom José

Tupinambá da Frota no dia 16 de janeiro.

1957 - 03 de novembro, dia da peregrinação vicentina,

os novos sinos foram abençoados por Dom José de

Bezerra Coutinho, então bispo auxiliar de Sobral.

1958 - Ano de forte seca. Devido à realização de um

baile nas proximidades do Santuário, a igreja foi

interditada e a festa encerrada antes do dia da

padroeira, como manda o decreto de 1932.

1964 - É construído pelo Padre Egberto Rodrigues de

Andrade (vigário de Martinópole) o muro ao redor da

igreja que até aquele ano era sem proteção.

1965 - Começa a funcionar o Educandário Nossa Senhora do Livramento na igreja primitiva.

2008 - Criação da Área missionária.

2012 - Elevação à Paróquia.




Obs: Direitos Reservados a João Victor Mascarenha, autor do livro.

Curas, Vigários e Párocos

 14° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



- Curato do Aracacu (Acaraú) -


Padre João de Matos Monteiro - 1712 a 1724

Padre José Dias Ferreira - 1725 a 1728

Padre João da Costa Ribeiro - 1728 e 1729

Padre Isidoro Rodrigues Resplende - 1730 a 1734

Padre Elias Pinto de Menezes - 1735 a 1740

Padre Lourenço Gomes Leal - 1740 a 1744

Padre Antonio de Carvalho e Albuquerque - 1744 a 1748


 -Vigários e Párocos-

Granja e Martinópole


Padre Luiz Fernandez de Carvalho - 1754 a 1774

Padre Luiz Pereira Viana - 1776 a 1791

Padre José Sancho Lelou - 1792 a 1806

Padre Antonio José Honorato de Barros - 1808 a 1829

Padre David Machado Portela - 1830 a 1835

Padre Francisco Antônio de Melo - 1836 a 1839

Padre João Barbosa Cordeiro - 1842 a 1850

Padre Antonio Tomaz Texeira Galvão - 1850 a 1897

Padre Leandro Texeira Pequeno - 1897 a 1904

Monsenhor Vicente Martins da Costa - 1905 a 1935

Padre João de França Melo - 1936 e 1937

Monsenhor Manoel Vitorino de Oliveira - 1937 a 1963

Padre José Prado Pontes - 1963 e 1964 (Não curou o Parazinho com vigário de Granja, apenas quando era cooperador).

Cônego Egberto Rodrigues de Andrade - 1963 a 1964 (Vigário de Martinópole, curou o Parazinho no lugar do Padre Pontes).

Dom Benedito Francisco de Albuquerque - 1964 a 1970 - (Hoje Bispo emérito de Itapipoca)

Monsenhor José Maria de Vasconcelos - 1971 a 2004

Padre Luiz Gonzaga Gomes Furtado - 2004 a 2006

Padre Genival Viana Porto - 2006 a 2008



- Área Missionária do Parazinho -

Padre Francisco (Sérgio) Coelho do Nascimento - 2008 a 2012


- Paróquia de Parazinho -


Padre Francisco (Sérgio) Coelho do Nascimento - 2012 a 2018

Padre Lucimarcos Geremias - 2018 a 2020

Padre Antonio Kelton Oliveira Marques - Pároco atual, desde de 2020.



Obs: Direitos Reservados a João Victor Mascarenha, autor do livro. 

A Festividade de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho

 13° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



    As festividades religiosas como celebramos hoje em suma, iniciaram no Brasil no segundo quartel do século XVIII, antes dessa época eram realizadas apenas curtas peregrinações ou apenas a missa ou celebração em louvor aos padroeiros.

   Em Parazinho, temos registros a partir desta época, que divergem muito dos tempos que se sucederam; não existia um clima religioso e o foco era distorcido para os divertimentos, brincadeiras e danças da época.

  Segundo consta em alguns documentos amealhados no Instituto do Ceará, o Padre Antônio Thomaz Teixeira Galvão ao assumir como Vigário de Granja em 1850, viu-se escandalizado com as “Noveninhas de seus paroquianos”. 

     É de notar a estranheza do Padre, pelo registro do Prof. José Eleutherio da Silva no Jornal Pedro II de Granja em agosto de 1862 em que trazia vários aspectos das festividades da época de seu vicariato que durou 47 anos.

“Na distância de cinco léguas desta cidade, existe uma capela de Nossa Senhora do Livramento, em um lugar denominado – Pará –, onde existem apenas 2, ou 3 moradores; mas pelo tempo da festa (que é 2 de julho, dia da visitação de Nossa Senhora) comparecem os povos da vizinhança e de outros lugares da freguesia”.

“Este ano foi uma concorrência imensa desta cidade, homens, e mulheres”, aí podemos ver uma descrição de Parazinho à época, com poucos moradores e como um lugar insolado, também a presença de pessoas de outras cidades.

   O autor continua narrando sobre os divertimentos que geraram tamanha estranheza ao Pe. Galvão, também relata a dispersão do povo aos ofícios religiosos em honra da Padroeira:

“Disseram-me que houve moscas por cordas e mosquitos por arames; isto é, que houve muito comes e bebes, muito outrago, lasquinet, e trinta e um: muito samba com a rabeca do Caninana, e muito espírito do diabo, isto é aguardente, nome que lhe dou em minha fraseologia, mas nenhuma oferenda, ou oblata oferecida a Nossa Senhora do Livramento para luzimento da sua festa, e maior esplendor da sua capela”.

“Nem se quer houve dinheiro para se pagar a um sacerdote que fosse fazer as novenas, foram estas feitas, pelo ex-sacristão Antonio Sabino da Rocha Franco, o qual deu graças a Deus, ser chamado para isso, afim de ganhar alguns vinténs, que sempre lhe serviram para mandar ao açougue ao menos oito dias; porque só fez oito novenas, a da véspera foi feita pelo reverendo Manoel Proto Lopes da Paz, vigário interino desta freguesia, o qual foi fazer a dita festa, que constou da missa cantada, e procissão; assistindo a música, a festa e novenas do princípio ao fim”.

    Podemos ver certo abandono da parte espiritual e ausência de sacerdote que pudesse celebrar durante a festa. Na época a Paróquia era governada pelo já citado Pe. Galvão, que foi por diversas vezes e por diversos motivos, afastado temporariamente de suas funções, assim só nos dois últimos dias um padre foi celebrar o final da festa, nota-se também a presença da banda de música, que como podemos ver, é uma tradição desde os primórdios de nossas festividades.

   Por algum motivo específico, mas sem registro algum do motivo, em certo período o dia da festa foi celebrado no primeiro domingo de julho, em 1900, voltando ao dia 02 de julho. A festa só ganhou a grande solenidade vista em poucas décadas atrás, a partir do vicariato do Padre Leandro Texeira Pequeno e principalmente do Monsenhor Vicente Martins da Costa. 

  Esses foram os primeiros a registrarem a história de Parazinho, é também dessa época os textos das orações da Novena que foram recentemente recuperadas pelo atual Pároco de Parazinho, Pe. Antonio Kelton Oliveira Marques.

    Monsenhor Vicente Martins solidificou de vez o culto a Nossa Senhora do Livramento de Parazinho por meio da propagação da história e devoção, também trouxe esplendor a igreja velha onde atuou, inclusive promovendo sua ampliação transformando-a em formato de cruz.

      Em um jornal de 1909, época do vicariato do Mons. Vicente, vemos uma festa celebrada com mais zelo e devoção, com a presença de cerca de 4.000 fiéis, número altíssimo para a época, principalmente para o isolado Parazinho, pois não haviam estradas e o único caminho eram as veredas e só se podia vir a pé ou a cavalo. As festividades também passaram por ameaças de suspensão devido às secas e epidemias, mas nunca foi suspensa sob o paroquiato do Monsenhor Vicente.

    Na década de 20 do Século passado, na época áurea das festas, Mons. Vicente Martins descreve a festa como sendo consagrada uma das maiores da região, com a realização de novenas, quatro procissões, missas, batizados, etc.

    As procissões eram a da bandeira, do estandarte dos milagres, do barco de Nossa Senhora e a procissão do dia de Nossa Senhora em que todas as imagens da igreja eram conduzidas nos andores. A procissão do Barco de Nossa Senhora deu lugar à procissão de São Pedro, sendo utilizado até hoje o mesmo barco.

     Mas os divertimentos mundanos e as confusões continuaram, mesmo com o trabalho apóstolo do Mons. Martins e de outros pregadores, o que levou Dom José Tupinambá da Frota a proibir em 1932 a realização de qualquer festa dançante durante a festa, sob pena de suspensão da festa e interdição da Capela, o que ocorreu em 1958. 

    Essa proibição foi observada até poucos anos, hoje em dia não é mais obedecida; mas pelo bem da verdade retórica, registro aqui que o decreto episcopal ainda está valendo por ser irrevogável.

    A festa seguiu os moldes projetos pelo Santo Monsenhor Vicente Martins por muitas décadas e até pouco tempo eram preservadas as tradições pelos párocos que inclusive continuaram a celebrar a novena de frente para o altar, mesmo após o concílio, essas tradições foram mantidas pelo saudoso Monsenhor José Maria de Vasconcelos e foram abandonadas após sua morte.

      A festa de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho é a 3° maior e mais antiga festa religiosa do Ceará, a maior da Zona Norte. Milhares de Romeiros se dirigem ao Parazinho durante os dias 22 de junho a 02 de julho para agradecerem, “pagarem” suas promessas e cumprirem as tradições religiosas de nosso povo. 

      Registramos a presença de peregrinos de todas as cidades da Zona Norte do Estado, bem como das demais regiões e de diversos outros Estados, com predominância do Piauí e Maranhão; também em maior número os romeiros do Mato Grosso, Pará, Rio de Janeiro e São Paulo.

     A Festa do Parazinho é um sinal de fé e esperança para o povo católico do Ceará e do Brasil inteiro, e merece e precisa de uma maior atenção das autoridades civis e eclesiásticas. 



Obs: Todos os direitos reservados ao autor do livro, João Victor de Oliveira Mascarenha. 

O Santuário Atual

 12° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 





     Com o crescente número de Romeiros, mesmo com as ampliações, a Igreja Primitiva não tinha mais capacidade para abrigar o vasto número de romeiros e devotos de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho e foi vista a possibilidade da construção de um novo Santuário. 

       O Vigário da época Pe. Manoel Vitorino de Oliveira pediu autorização ao Primeiro Bispo de Sobral, Dom José Tupinambá da Frota, para erigir o novo templo, o que foi aprovado por decreto episcopal em 1941.

      Em 02 de Julho de 1941 foi lançada a Pedra Fundamental do Santuário em Solenidade presidida pelo então Vigário Geral da Diocese de Sobral Monsenhor Olavo Passos. A planta em estilo Toscano foi obra do renomado arquiteto e escultor italiano Agostinho Balmes Odísio. Iniciou-se então a construção do templo em sistema de mutirão, toda a comunidade participou ativamente da construção do Santuário.

     Em setembro de 1941, as obras foram paralisadas ainda nos alicerces e foram retomadas em 18 de agosto do ano seguinte (1942). Ao todo, o magnífico templo foi construído em apenas 18 meses, o que até hoje é alvo de admiração devido às inúmeras dificuldades daquele período como a inexistência de equipamentos e tecnologia, dificuldades financeiras, de transportes e comunicação, como também as dificuldades devido ao período da Segunda Guerra Mundial.

    Um fato miraculoso ocorreu durante a construção do Santuário; para o serviço de finalização da Torre do Santuário, uma equipe de técnicos vindos da Capital do Estado, Fortaleza, instalava o alto-relevo no frontispício, assim que terminada as instalações, o rústico andaime de Carnaúba desmoronou, jogando ao chão aqueles trabalhadores. 

     Passado o curto momento de desespero geral causado pela anunciada tragédia, constatou-se que nada havia acontecido aqueles homens que despencaram de uma altura de quinze (15) metros, vendo isso, Monsenhor Manoel Vitorino de Oliveira, idealizador e responsável pelas obras exclamou: "é o primeiro milagre da Igreja Nova".

   Em 06 de janeiro de 1944 foram iniciadas as comemorações para a inauguração do templo com as Santas Missões pregadas pelos Frades Capuchinhos frei Cecílio e frei Romualdo; durante esses dias foram celebradas missas, novenas, procissões e administração de sacramentos. No dia 12 de janeiro o povo em festa recebeu com entusiasmo a comitiva de Dom José Tupinambá da Frota, Bispo de Sobral.

      Na manhã do dia 16 de janeiro, Dom José Tupinambá da Frota procedeu a bênção ao imponente Santuário. Ao entardecer houve a solene procissão de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho e o canto do Te Deum; no dia seguinte uma missa solene em ação de graças por todos que concorreram a construção e as celebrações de bênção do templo.

    O Santuário de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho é um dos mais conhecidos Santuários do Nordeste, Centro de Peregrinações para onde acorrem milhares de peregrinos durante todo ano, principalmente durante os períodos dos novenários à Padroeira que acontecem duas vezes ao ano.


Obs. Todos os direitos reservados a João Victor Mascarenha, autor do livro. 


A Barragem Sobre o Riacho Jaguarapi

 11° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



        O Riacho Pará que deu nome ao Parazinho, hoje denominado Riacho Jaguarapi, nasce na Lagoa Angica em Martinópole e tem sua bacia no rio Coreaú. Foi barrado pela primeira vez em 1892 por iniciativa do Padre Francisco Ignácio da Costa Mendes, natural de Boa Viagem e Vigário de Camocim; estava responsável pela Paróquia de Granja devido os problemas de saúde do Vigário Pe. Texeira Galvão.

      Em 1911 foram iniciados os estudos para a construção de uma nova barragem por interferência do Padre Vicente Martins da Costa, ele mesmo em 1909, fez uma subscrição para aumentar a altura da parede, mas não conseguiu o feito naquela ocasião.

     No mesmo ano de 1911, foram realizados estudos pelo agrimensor italiano Dr. Vicente Piceffine em abril e pelo americano Dr. Geraldo Waring em novembro. Usando os recursos financeiros da emergência da seca de 1915, são iniciadas as obras em agosto de 1916 tendo como responsável o engenheiro Dr. Floro Freire.

    As obras foram concluídas em 1917 sob comando dos engenheiros Dr. Pinto Pompeu e Dr. José Pereira; Parazinho deve ao Monsenhor Vicente Martins da Costa a Construção do Açude que foi construído sob sua iniciativa e interferência. Segundo dados do governo, o reservatório tem capacidade aproximada de 2.602.000 M3 e altura de aproximadamente 11 metros e 60 centímetros. 


Obs: Todos os direitos reservados ao autor, João Victor Mascarenha.

Peregrinação Vicentina ao Santuário de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho

 10° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



     A tradicional e mais que centenária Peregrinação Vicentina ao Santuário de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho, foi iniciada pelo vigário da época Pe. Vicente Martins da Costa e pela conferência Vicentina de São José de Granja. A primeira Peregrinação Vicentina ocorreu a cavalo no dia 05 de novembro de 1911.

     Sobre essa festividade, assim relatou seu idealizador, Mons. Vicente, na década de 20 do século passado, poucos anos após à primeira Peregrinação:

     “O dia da peregrinação vicentina é outro dia de festa para os devotos de N. Senhora do Livramento e moradores do Parazinho.

   No primeiro Domingo de Novembro, desde o ano de 1911 que os confrades de S. Vicente de Paulo reunidos com alguns devotos de N. S. do Livramento costumam ir em romaria à milagrosa Capela do Parazinho.

  Os vicentinos juntamente com os devotos de N. Senhora assistem às 4 horas da manhã a missa que é celebrada na Matriz de Granja e em que se fazem as primeiras orações da bênção dos peregrinos.

     Em seguida reunidos ao pé do cruzeiro, partem todos a cavalo conduzindo um estandarte de N.Senhora e rezando o terço da Bem Aventurada Virgem durante todo decurso da viagem. A distância a vencer é de quase quatro léguas.

     Na tarde de véspera muitos de Granja costumam ir de pé, pernoitando a duas léguas em Mato Grosso para no dia seguinte ao amanhecer entrarem no povoado; outros de automóvel partem da cidade pela manhã, e de toda parte pelas estradas passam aos pequenos bandos sertanejos devotos em direção do Parazinho.

     Às sete horas da manhã os peregrinos dão entrada solene no festivo Povoado, sendo dissolvida a peregrinação depois da missa em que é dada a bênção dos peregrinos.

     O altar da milagrosa imagem nesse dia acha-se festivamente ornamentado e toda capela fica repleta de piedosos crentes vindos de diferentes pontos do município, que desejam associar-se aos abençoados peregrinos. Anos há em que mais de duzentos cavaleiros partem de Granja formando a piedosa romaria.

     A peregrinação vicentina é, pois, outra festividade pia, que de ano a ano vai se tornando notável, enchendo as almas dos melhores sentimentos de piedade e do mais vivo reconhecimento à celeste intercessão de N. Senhora do Livramento".



Obs: Direitos Reservados ao autor do livro, João Victor Mascarenha. 


Monsenhor Vicente Martins da Costa

 9° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 




   Monsenhor Vicente Martins da Costa, Vigário de Granja entre os anos de 1905 a 1935; nasceu em Fortaleza em 19 de julho de 1880, filho do Tenente-coronel João Martins da Costa e Ursulina Martins da Costa. Foi ordenado por Dom Joaquim José Vieira na Sé Catedral no dia 28 de março de 1903.      Nomeado coadjutor da Paróquia de Granja em 21 de abril de 1903 e vigário de Camocim em 11 de fevereiro de 1904. 

   Foi transferido como Vigário de Granja a 07 de fevereiro de 1905, cargo que exerceu durante 30 anos, onde fez o melhor do serviço religioso. Foi também historiador, professor e escritor. Fez dezenas de melhorias na Igreja Primitiva de Parazinho, idealizou a barragem sobre o Riacho Jaguarapi (açude) e a Peregrinação Vicentina em 1911. Escreveu o Livro “A Capela Milagrosa de Nossa Senhora do Livramento do Parasinho” em 1923. nomeado para a paróquia do Patrocínio em Sobral no ano de 1936, faleceu em 1948 em São Paulo. 



Obs: Direitos Reservados a João Victor de Oliveira Mascarenha, autor do livro. 

Jerônimo Machado Freire

 8° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



     Não se sabe ao certo onde e quando nasceu Jerônimo Machado Freire, mas supõe-se que não seja português e que teria nascido no Ceará ou em Pernambuco. Sabemos, no entanto, que morreu com mais de oitenta anos em 1797.

     O mais antigo registro que encontramos sobre Jerônimo é da fundação da Irmandade do Santíssimo Sacramento em Sobral; quando a irmandade foi canonicamente criada na matriz de Nossa Senhora da Conceição da Caiçara, Jerônimo foi um dos fundadores. Essas irmandades eram formadas por homens influentes que servissem a religião e a construção e manutenção das igrejas. 

     Em 15 de março de 1754 faleceu Domingos Machado Freire; solteiro e sem descendência, deixa sua grande riqueza com muitas propriedades a Jerônimo Machado Freire, seu sobrinho.

     Em contrapartida, Jerônimo Machado deveria se casar com a filha de Francisco Machado Freire. A noiva era sobrinha de Domingos e prima de Jerônimo, talvez Domingos pretendia assegurar seus bens com a família Machado Freire; o casamento como Domingos Machado estabeleceu não ocorreu.

     Domingos também determinou que se houvesse algum impedimento com o casamento com a filha de Francisco Machado, Jerônimo poderia se casar com qualquer mulher desde que fosse branca e cristã velha. Jerônimo se casou com Germana Francisca de Vilar, filha do Capitão Domingos Francisco Braga, homem muito influente. 

     Jerônimo foi um homem bastante rico e influente, possuía inúmeras fazendas e grandes faixas de terra, foi um dos responsáveis pela fundação da “Vila Destinta e Real de Sobral” onde também ocupou vários cargos políticos.

     Sua esposa Germana Francisca Vilar faleceu em 1791; o casal nunca teve filhos e não deixou herdeiros. Jerônimo Machado Freire faleceu em 04 de junho de 1797 e foi sepultado na Matriz, hoje Catedral de Sobral. Herdou sua grande fortuna o Sargento-Mór Manoel Machado Freire de Souza.

Doador de parte das terras do patrimônio de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho, administrou o patrimônio até sua morte; durante sua administração foi adquirida a Imagem da Padroeira que se venera em Parazinho. 



Obs: Todos os direitos reservados ao autor João Victor Mascarenha. 


A Imagem

 7° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 




   A Imagem de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho, que se encontra a veneração no Santuário, no mais puro estilo barroco colonial, tem origem portuguesa e foi adquirida em Pernambuco, no ano de 1795, pelo Capitão Jerônimo Machado Freire.  

   Adquirida por conta do patrimônio, custou 70$000 (70.000 - setenta mil réis). Monsenhor Vicente Martins, assegurou em seu livro sobre a História da Capela de Parazinho que na época da compra da imagem, um boi custava 6$500 (6.500 - seis mil e quinhentos réis).

  Daí podemos supor o valor que a imagem teve na época, soma-se hoje o valor incalculável em nossa fé, história, cultura e devoção. É uma das mais belas e importantes representações do barroco no Brasil e é alvo da devoção de milhares de romeiros, peregrinos e devotos.

  Antes desta imagem ser adquirida em 1795, era venerada na Igreja Primitiva uma imagem de menor tamanho; segundo algumas informações que temos, tinha um vulto de aproximadamente 50 (cinquenta) centímetros e foi a primeira imagem de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho.

   Há algumas décadas atrás foi doada a Guilherme Teles Gouveia pelo senhor Raimundo Hermínio de Melo (Doca Bruno), que afirmava que a imagem pertencia aos seus antepassados para a inauguração da Igreja.

    Sabemos com precisão sobre esse assunto porque o próprio Guilherme Gouveia escreveu no livro “Granja - Assentamentos Históricos do Município e a Festa Religiosa de N. S. do Livramento do Parazinho” em 1974. Hoje não se sabe ao certo o paradeiro dessa imagem que é dada por perdida.



Obs: Direitos reservados a João Victor Mascarenha, autor do livro. 

O Património

 6° Capítulo do Livro "Parazinho" de João Victor Mascarenha 



    O Património consta de uma légua quadrada, sendo meia légua para cada ponto cardeal, era marco das terras, como cita Monsenhor Vicente Martins da Costa, “uma pedra existente no terraço da casa de Manoel Joaquim Salgado” que ficava próxima a igreja, não havendo mais resquícios da mesma, hoje serve como demarcação a Igreja Primitiva.

     Sobre a origem do patrimônio, é importante salientar a grande quantidade de animais e faixas de terra deixados como património a Capela por seu construtor, Capitão Domingos Machado Freire, em seu testamento.

     Sobre a légua de terra, há uma história oral que foi publicada no livro “A Capela Milagrosa de Nossa Senhora do Livramento do Parasinho”, escrito por Monsenhor Vicente Martins da Costa que narra com precisão de detalhes a história que é considerada um grande milagre de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho. 

   “Conta-se que o coronel Jeronymo Machado Freire tinha grande predileção por caçadas e muito particularmente pelas caçadas de onças, que nesse tempo em grande quantidade habitavam em nossas matas; e para isto dispunha de cães afamados…

    Certo dia em companhia de três ou quatro amigos muniu-se do armamento necessário e fazendo-se seguir pelos seus cães tomou o caminho da mata.

     Depois de bem andar, os caçadores foram se distanciando uns dos outros, tendo Jeronymo Machado seguido por uma vereda estreita, que margeava uma corrente d'agua ao sopé de um serrote, quando de repente lhe saiu ao encontro uma onça tigre. Distante de seus companheiros e só, surpreendido pela fera, valeu-se de Nossa Senhora do Livramento, soltando de espanto um grande grito. Um dos cães logo aparecendo pôs-se a ladrar, o que despertou a atenção dos companheiros que vindo em seu auxílio com outros cães, lutaram com o bravio animal, deixando-o depois morto estendido no chão.

    Em agradecimento a Nossa Senhora do Livramento por lhe ter salvado a vida, diz-se, que de suas terras fez doação de meia légua para seu patrimônio, sendo ele o primeiro procurador.

  Ao Coronel Jerônimo Machado Freire sucedeu na administração patrimonial o seu herdeiro e testamenteiro Sargento-mór Manoel Machado Freire de Souza, que administrou o patrimônio desde 1798 até 1803. A este sucedeu na administração Manoel Pereira Dutra, que foi procurador do patrimônio desde 1804 até 1808, o qual foi substituído por Antonio Alves de Oliveira, que o administrou de 1809 a 1823.

     Todos estes procuradores prestavam contas em Sobral de dois ou de três em três anos aos ouvidores gerais provedores dos ausentes e capelas, que eram então nomeados pela corte de Lisboa”.

     Monsenhor Vicente Martins narra a história em que a tradição popular alude ter sido o motivo da doação deste vasto patrimônio à Igreja de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho, em seguida, faz o registro de seus procuradores e suas obrigações perante à corte, já que nesta época o Brasil vivia sob a dominação do Império português, que também administrava os assuntos e bens da Igreja, no reino e nas colônias. 

     Segundo o que se pode notar pelos registros apontados por Monsenhor Vicente é que após a independência do Brasil em 1822, foi adotado outro sistema de administração, pelo menos na área em que se refere ao patrimônio da Igreja de Parazinho. 

Atualmente, o extenso Carnaubal do patrimônio de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho é administrado pela Diocese de Tianguá, e gera anualmente relevante lucro ao óbulo diocesano, já que a Paróquia de Parazinho recebe apenas uma pouca porcentagem para a manutenção e luzimento do Santuário de Parazinho. Também, há poucos anos foram vendidos os últimos animais do gado, remanescentes dos animais deixados por Domingos Machado Freire, Patriarca de Parazinho, restando apenas as terras como patrimônio. 


Obs. Transcrevemos os textos do livro “A Capela Milagrosa de Nossa Senhora do Livramento do Parasinho” neste capítulo, modificamos a ortografia original do livro para a melhor compreensão do leitor; haja vista a diferença da ortografia da década de vinte do século passado com a atual. 




Obs: Todos os direitos reservados a João Victor de Oliveira Mascarenha, autor do livro.

JORNAL N.S. DO LIVRAMENTO

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